Dois homens habitavam uma erma ilha fluvial e desde crianças, caminhavam às margens daquele grande rio, que de tão largo não lhes possibilitava ver, nem saber o que havia do outro lado. As suas incapacidades de atravessarem o rio fazia com que dia após dia inventassem as mais mirabolantes histórias sobre o que deveria existir do outro lado.
Quando já estavam com idade bastante adiantada, um navio vindo de um lugar distante ancorou naquele pequeno vilarejo, trazendo uma tripulação que expressava profunda admiração com as coisas do lugar.
Quando estava prestes a retornar ao seu lugar de origem, o comandante convidou aqueles dois senhores para conhecerem o outro lado, o qual tanto admiravam. O convite tentador causou grande perturbação naqueles dois, e durante horas relutaram diante da possibilidade de concretizar o sonho de uma vida e o medo de se decepcionarem diante do que poderiam encontrar… Mesmo assim aceitaram.
Estar naquele lugar era como adentrar a um templo sagrado, tudo inspirava sonhos e fantasias, embora nada, nem de longe se assemelhassem aos seres e objetos de suas histórias. As mulheres, por exemplo, não eram tão compreensíveis, tão amáveis e nem tão belas quanto às imaginarias, mas eram diferentes de todas que já haviam conhecido, e isso era fascinante.
Minutos antes de retornarem, ao se aproximaram do cais, avistaram, a curta distância, dois garotos entusiasmados contando histórias fantásticas sobre o outro lado, exatamente como haviam feito a vida inteira. Poucos metros adiante encontraram dois velhinhos que também falavam das maravilhas que existiam do outro lado. Dentre as muitas coisas ditas por eles, afirmar que lá, do outro lado, ninguém ficava velho foi a mais marcante.
A conversa daqueles velhinhos chamou-lhes a atenção e resolveram se aproximar e perguntar o que os fazia acreditar que do outro lado do rio existia um mundo tão maravilhoso. A pergunta fez com que os velhinhos olhassem mais uma vez para o outro lado e de modo surpreendente respondessem que tudo que existia onde moravam, embora fossem apreciáveis e amáveis, eram comuns, enquanto que, o que estava do outro lado era absoluto… Era absoluto porque os fazia sonhar…
Quando aqueles dois homens entraram no navio que os levaria de volta à terra natal, se puseram a lembrar, com saudade, das coisas que havia na terra onde nasceram e isso os emocionou muito. Quando o navio ancorou, eles desceram e começaram a andar naquela margem, como haviam feito a vida inteira, só que pela primeira vez, de costas para o rio. Foi uma experiência maravilhosa, pois, pela primeira vez, contemplaram a intensidade da beleza e sentiram a imensidão de possibilidades que ali existia.