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Ponte Hercílio Luz – Florianópolis bicodocorvo.com.br |
Para pessoas como eu que vivem nas regiões Norte e Nordeste o desejo de conhecer o Sul do país é algo sempre presente. Imaginamos que lá acontece tudo que falta nas outras regiões.
Fiz essa breve introdução para falar de minha primeira viagem à capital do Estado de Santa Catarina. Fui participar do seminário FAZENDO GENERO 9, um evento que até então me era desconhecido.
O evento contou com a participação mais de quatro mil pessoas. O nível dos palestrantes e dos trabalhos apresentados foi muito elevado, fiquei fascinado com a multiplicidade de temas discutidos e pela grande quantidade de intelectuais envolvidos numa temática que no Estado onde vivo, o Tocantins, quase não é percebido, principalmente na educação Básica onde atuo.
No primeiro dia à tarde participei de uma discussão sobre direitos humanos e à noite da abertura. Como nossa primeira atividade terminou tarde não fui ao hotel. No intervalo entre uma atividade e outra comecei a ficar preocupado com algo que começou a querer sair de mim. Na bíblia está escrito que o grande mal é aquele que sai da boca do homem. Se fosse em outra ocasião não haveria nenhum problema, mas naquele momento o que precisava sair de mim era mesmo nocivo.
Tentei segurar ao máximo, entretanto quanto mais esforço fazia para segurar, mais ele se esforçava para sair. Travava uma luta ferrenha comigo mesmo quando me dei conta que a próxima atividade estava prestes a iniciar e pelo que constava na programação o tempo seria muito longo. Tempo era tudo que eu não tinha, então tratei logo de resolver meu problema.
Por ter grande curiosidade em conhecer os banheiros dos lugares aonde vou aproveitei para unir o útil ao desagradável. Parece que cagar em banheiro público é como cometer um crime. Olhei à distancia para ter uma visão panorâmica da área, constatei que a entrada estava desobstruída. Dirigi-me ao local fazendo atalhos para despistar os transeuntes que estivessem dispostos a me seguirem.
Quando adentrei a porta do banheiro me senti aliviado não havia ninguém nem fazendo xixi. Acelerei o passo entrei no recinto onde se encontrava o vaso. Nesse momento me pus a analisar a dimensão daquele cubículo de aproximadamente 1m X 1,5m². O vaso estava limpíssimo sem nenhuma marca de xixi nem nas bordas, nem na tampa e mais nem resto de fezes havia boiando na água. O chão também estava muito limpo, a lixeira estava vazia. O rolo de papel higiênico estava pela metade. Se houvesse uma nota para o quesito limpeza eles tirariam dez.
Mas faltava o último item que para todo apreciador de banheiro é fundamental, a análise das paredes e portas. No caminho vinha imaginando o que os estudantes do sul escreveriam nos banheiros. Por incrível que pareça não havia um único rabisco em nenhuma das três paredes internas, mas para meu alívio na porta havia uma frase que definitivamente confirmava que os estudantes do sul também rabiscam seus banheiros, ou que rabiscar portas de banheiro faz parte da cultura nacional. Estava escrito: “O pau do Du” confesso que não entendi. Se fosse do Gu imaginaria que se tratava de um fã do tenista GUGA, ilustre morador da cidade.
Com o banheiro limpo e apenas uma frase emblemática iniciei a liberação do ser nocivo que insistia em sair de dentro de mim. Com pouco esforço lancei uma estrondosa rajada de gases com minúsculas partículas de fezes. Esperei pela segunda, mas ela não veio. Tomei a iniciativa de massagear a barriga, mas também não adiantou, todo esforço emito havia sido em vão, entretanto a vontade persistia. Depois de longa espera me limpei e saí. Quando cheguei à pia havia muitos desconhecidos em fila aguardando para utilizar os vasos.
Quando dei o primeiro passo fora do banheiro a vontade intensificou-se, comecei a transpirar, mesmo o clima estando muito frio. Quando olhei para o povo que circulava pelo salão percebi que havia alguém que me conhecia e que estava fazendo aceno para mim. Dirigi-me a ela cumprimentei-a e inventei que iria pegar algo que havia esquecido do outro lado do salão. Entrei no meio do povo e novamente retornei ao banheiro, ao lado da porta estava o mesmo grupo de estudantes da primeira vez, mas fingi que não os vi novamente.
O banheiro estava cheio, tive que ficar na fila de espera. Fila de espera em banheiro público possui uma hierarquia própria que transcende o status econômico, político, ou social. No banheiro todo mundo é cagão, mijão, ou lavão/espelhões. Os cagões são a ralé, geralmente não tem direito à fala. Os mijões conseguem falar um pouco mais, é o grupo intermediário e finalmente os lavões, ou espelhões que são os dominantes. São aqueles que entram apenas para zombarem dos outros, a desculpa é passar um batom, lavar o rosto, ou apenas se olhar no espelho, geralmente são os que mais conversam, essa é uma estratégia que usam para permanecerem por mais tempo no banheiro.
Estava na fila de espera puto da vida, essa é outra característica própria dos cagões, geralmente estão ali por obrigação e fazem questão que todos percebam isso. Mesmo que chova canivete não é perceptível alegria em seus rostos, todo cagão que se presa tem que demonstrar que só está ali por que não conseguiu segurar.
Esclarecimentos à parte retorno à fila de espera. Do lado direito ficava o mictório, do esquerdo o cagatório. Quando chegou minha vez liberaram duas vagas simultâneas uma para cada função, nesse momento um apressadinho que estava atrás de mim tentou se dirigir ao meu destino, mas interpelei falando duro que era minha vez, ainda bem que ele não reagiu com agressividade, caso contrário ia ser duro segurar.
Entrei no minúsculo recinto que por coincidência era o mesmo anterior, só que dessa vez não estava tão limpo, entretanto a frase continuava a mesma: “O pau do Du”. Fiz todos os procedimentos preventivos rotineiros, enxuguei as bordas do vaso e pus papel cobrindo-as e sentei-me, nesse momento sem nenhum esforço liberei um grande jato de gases e com ele saiu algo que eu queria me livrar para sempre; a saída dele me provocou uma sensação de alívio que até então desconhecia. Como da outra vez o alívio não foi completo por mais esforço que eu fizesse, por mais que eu esperasse a segunda etapa não aconteceu.
Quando me reergui que olhei para o que havia feito me senti indignado: era um tolete flutuante daqueles que parecem que estão sorrindo da cara de bobo da gente. Nesse instante olhei para ele e disse: – seu filho da puta!!! Gritei com tanto prazer que quando abri a porta havia uma platéia me aguardando curiosa para saber do que se tratava. Outra regra própria dos banheiros, geralmente ninguém pergunta o que você estava fazendo no vaso. Foi a primeira vez que xinguei um tolete de bosta e confesso que aquilo me fez muito bem.
Em seguida vesti minhas roupas e fui assistir à abertura do evento totalmente desprotegido imaginando que a qualquer momento fosse obrigado a retornar.