O inicio de minha trajetória terrena é antecedido pelas mortes dos conjugues dos meus pais. Ambos cerca de dois anos antes.
Cheguei como parte de uma grande família: do primeiro casamento do meu pai havia doze e do primeiro casamento de minha mãe quatro, totalizando dezessete filhos. Seguindo a trajetória filial do meu pai descobri que era o decimo terceiro cavaleiro e o único com o nome dele.
O DÉCIMO TERCEIRO CAVALEIRO
Na távola redonda minha missão seria ajudar os nobres cavaleiros a encontrarem o Santo Graal e restaurar o caótico reino da Inglaterra daquele período.
Literatura cavalheiresca à parte. Sou grato pela conspiração do universo que me trouxe a este mundo, num período tão especial da trajetória humana neste planeta. Assim como sou grato pela minha permanência.
Voltando à minha jornada. O dia 09 (nove) de maio e o dia 23 (vinte e três) de agosto de 1968 foram os dias do meu nascimento. Enquanto que dos dias 24 (vinte e quatro de maio) a 22 (vinte e dois) de agosto do mesmo ano, registra-se mais três dezenas das minhas primeiras mortes.
A lenda popular afirma que gatos tem sete vidas, então deve haver algo desse felino em mim para continuar renascendo como uma fênix.
O meu nascimento, no meio de uma selva, durante quatorze dias foi motivo de alegria para as cinco famílias que ali habitavam. Mas, como para o decimo terceiro cavaleiro a batalha precisava começar cedo, quinze dias foi meu período de descanso.
Aos quinze dias de nascido contraí Coqueluche. Três meses depois meu estado de saúde alcançava seu ponto mais crítico. Por diversas vezes havia desmaiado e recebido velas postas sobre as mãos, um ritual de celebração de morte infantil, muito comum naquela localidade, naquele período. Foram tantas as vezes que morri e renasci que haviam perdido a conta.
À medida que as velas eram postas o pranto tomava conta da família e dos vizinhos. Mas o que consideravam milagre acontecia poucos minutos depois, o retorno da respiração, e com isso as velas eram apagadas e os vizinhos retornavam às suas casas. Contudo, as esperanças começavam a desaparecer à medida que o tempo passava e o quadro clínico não melhorava.
A BATATA DE PURGA, O MILAGRE QUE VEIO DA TERRA
No dia dezesseis de agosto daquele ano uma vizinha ficou sabendo que uma batata havia curado um caso de coqueluche de um parente muito distante. De posse dessa informação a vizinha caminhou mais de um quilômetro nas veredas selvagens daquela localidade até a nossa residência para contar a boa nova.
Ao receber a informação, minha mãe não teve dúvidas de que poderia dá certo. Como conhecia muito da vida selvagem daquele lugar ela sabia onde encontrar a tal batata de purga como era conhecido o tubérculo.
Na madrugada do dia seguinte reuniu as últimas forças, depois de quase quatro meses sem dormir, e lançou-se, acompanhada por seus cães de caça no meio da mata à procura do tubérculo que curava Coqueluche. Caminhou por cerca de quatro horas até encontrá-lo. Após retirá-lo fez o mesmo percurso de volta. Quando chegou a casa já passava do meio dia.
A medicação só foi aplicada três dias depois por causa de uma série de cuidados que o tubérculo exigia. A reação imediata pós-ingestão da batata não foi nada animadora para a família, porque além da tosse rotineira iniciou-se uma forte onda de vômitos e disenteria seguidos por um profundo sono. Como a minha respiração era frágil ficava difícil identificar o movimento do estômago e com isso novamente velas foram acesas para sinalizar minha morte.
A noite daquele dia 22 de agosto foi marcada por uma profunda tensão que não possibilitou que nenhum adulto dormisse. Na manhã do dia seguinte a tosse sessou e aos poucos os sintomas foram desaparecendo até a completa cura daquela enfermidade.
NOVO CICLO, NOVAS LUTAS
Mas essa não foi a única batalha decisiva que tive que enfrentar pela vida. Aos seis anos fui atropelado por uma bicicleta e fiquei cerca de seis meses sem andar em consequência de um nervo da perna esquerda ter sido extraído.
Pela cura dessa enfermidade paguei uma promessa que foi fazer todo o percurso da procissão do santo protetor de minha mãe, São Bernardo, descalço, vestido de mortalha.
Aos sete anos travei uma dura batalha com o sarampo chegando ao ponto de o médico falar para meus pais que minhas chances de sobrevivência eram mínimas.
Aos nove anos finalizei a onda de doenças com uma hepatite tipo “A” e uma medicação errada que me levou a um estado de gravidade profundo.
O ÚLTIMO MOMENTO É SEMPRE O COMEÇO
A última grande batalha ocorreu aos 12 (doze) anos quando decidi atravessar o “Tapuio da Estrela” (rio de duas estações que banha a cidade) no período da cheia. Já havia conseguido atravessar os outros dois: Tapuio dos Morros e do Vai-Quem-Quer, mas faltava o maior de todos, cuja extensão no período da cheia era entorno de cinco quilômetros. Junto com a inseparável turma de amigos resolvi enfrentar meu maior desafio de nadador.
Tudo transcorreu bem até mais ou menos os últimos quinhentos metros quando minhas forças começaram a desaparecer. As táticas de mudança de estilo, peito e costas, para descanso não funcionavam mais, enquanto as forças continuavam se esvaindo até o esgotamento total.
Sabia que gritar não resolveria. Não havia possibilidades de alguém chegar a tempo para me socorrer em decorrência da distância e do cansaço em que se encontravam.
Aquela foi a primeira vez em sã consciência que estive cara a cara com a morte. Uma onda de dor e tristeza tomou conta da minha mente.
A sensação de impotência me levava ao encontro da fragilidade da vida diante da impiedade da morte.
Naquele momento, sem forças, vi meus sonhos se esvaírem enquanto triunfava nas profundezas…
Mas como para o décimo terceiro cavaleiro, com as sete vidas de felino e com a capacidade de renascer da fênix, o último momento é sempre o começo. Como último recurso preparei meu corpo para flutuar em posição ereta. Essa era a única coisa que pude pensar e fazer naquele momento. Foi justamente aí que senti algo debaixo dos meus pés. Rapidamente percebi que estava sobre uma árvore de pequeno porte. Procurei apoio de forma que aqueles galhos finos pudessem me ajudar a flutuar com o mínimo de esforço.
Aquela árvore submersa que nunca soube a que espécie pertencia me salvou. Precisei de poucos minutos para recuperar as forças e reiniciar minha jornada.
A pequena São Mateus, hoje viva nas minhas lembranças além de fazer parte dessa intensa luta pela vida. Guarda uma imensidão de saudades de uma infância plenamente feliz.
O ENIGMA
DO ANO SEIS
Superstições, ou acaso, os anos com terminações 6 (seis) foram marcados por grandes transformações na minha vida: primeiro a mudança para Vitória da Conquista na Bahia em 1986 onde conclui o Ensino Médio e a Faculdade de História, aprendi a amar a Bahia e iniciei a carreira de escritor.
No ano de 1996 escolhi o Tocantins para viver. Sou profundamente grato por tudo que conquistei aqui.
Hoje sinto-me um cidadão brasileiro originário dos três Estados onde morei e resido atualmente: sou maranhense infantil, baiano adolescente e um adulto tocantinense.
O ano de 2006 foi marcado por um profundo revés na minha vida familiar, a morte da minha mãe. Quando meus pais se separaram eu tinha treze anos. Vendo as inúmeras dificuldades que minha mãe passou a enfrentar fiz uma promessa comigo mesmo de que cuidaria dela e não deixaria que nada lhe faltasse.
Mas diante do câncer avançado tudo que eu mais desejava era que alguém me dissesse onde havia uma batata de purga, ou qualquer recurso que curasse a doença. Não poder retribuir o que ela conseguiu fazer por mim foi algo que me machucou profundamente por muitos anos.
Para continuar com o final seis como ano de impacto em 2016 veio a separação de um casamento de treze anos e pela primeira vez passei a morar sozinho. Esse foi um ano de intenso aprendizado e de descobertas extraordinárias que tem me proporcionado um profundo diálogo comigo mesmo e hoje faz sentir-me renascido para a admirável beleza da vida.
MINHAS ESCOLHAS…
MEU DESTINO
Escolhi a carreira de professor de História por gostar e acreditar na educação. Sou funcionário da Secretaria de Educação do Estado do Tocantins; membro do Grupo de Consciência Negra do Tocantins.
Sou um eterno amante da arte de escrever. Sempre que inicio, durante o período em que estou trabalhando e quando concluo uma nova obra sinto-me profundamente grato.
Todas as vezes que leio, ou falo de uma das minhas seis obras publicadas: Sob a Luz do Sol e Poesias na Janela (poesia), Além das Tempestades (Crônicas), Flores, Espinhos e Vendavais, Os dez contos e O Homem Que… (contos), sinto-me semeando um pouco de centelhas no jardim da vida que comigo renasce de braços dados com a esperança, a ternura e a alegria que carrego comigo para onde quer que eu vá.
Bom não me canço de ler suas poesias ,me faz lembrar desde quando te conheci um menino bom de tantas imaginações uma pessoa simples com um potencial gigante te admiro cada vez mais posso dizer que vc é a pessoa que sabe viver te desejo uma carreira longa é uma felicidade plena abraços
Muito interessante conhecer mais um pouco de sua história através de uma linguagem simples e docemente poética. Que 2017 multiplique suas 7 vidas por 70×7.